terça-feira, 2 de julho de 2013

Conto


 " uma vez eu escrevi assim: me disse que viver de pleno o coração era natural - e eu, eu ali, não entendi nem me permiti entender, de tão grande que era o medo de aceitar a inundação e a tempestade - eu com medo da tempestade e a cidade flutuante em que vim morar. flutuo na minha calma tão triste e tão vazia que vou flutuando e aumentando em volume esse mar com lágrimas. e meu coração vai se deixando levar e vou flutuando com a calma e com a esperança de chegar em algum lugar, e não estou chegando - e é tão frágil que não pode suportar o lusco-fusco do jogo que é amar. não pedi para que fosse compreendido mas sim para que fosse aceito, então que me destruíssem e nos restos me encontrassem, refeito. mas esse não sou eu, esse é aquele que eu deveria ser-- eu queria poder me contar que eu estava inteiro naquele instante mas me cerca a duvida e me ronda e canta. talvez eu tenha sempre estado flutuando calmo e lívido, apenas por um dia estive fora de mim nu num sonho porém regressei ao final dum sono muito im-particular ... aqui estamos. calmos. flutuando.
 agora entretanto essa tristeza espelhada duma água sépia em mares abstratos é tão singular - singela - desesperadora. antes eu era criança e brincava de viver na tristeza sonhadora, assim são os meninos sensíveis às palavras (?) mas agora ... um homem disforme apenas pode dizer o quê? a felicidade e a mágoa são escolhas como escolho onde ir almoçar. apenas não escolho aquilo que sinto (mas até essa verdade se diluiu ... ). posso escolher onde chegar flutuando e posso abraçar, braçadas, frutos - ou posso me perder no tempo e chorar, e as duas coisas são válidas e corretas e estupidas e erradas pois, depois de perder alguém, depois de perder a si, e depois de ver numa tarde o mar cair sobre o céu eu já não sei de coisas certas. essa história começou quando um menino solitário perdeu o medo de tocar a realidade próxima. e batizou a descoberta por: amor. "

 ***

 a realidade próxima é uma distância. ilhas que assustadas fogem ao tocar dos barcos repletos de existência.  vamos falar do menino; era um rio-vazante de atrito e detrito afeto, por que na água seu som se diluia ao invés de propagar e perder, tomava forma de corpo e som água; mal posso explicar onde perdi as palavras disso. pois eu amava esse menino sem o encontrar entre outras paragens de comoção pública - senão nelas. entretanto ele é todo uma represa insuportável de conceber a própria vida e de se perder.
 ironicamente, este mesmo garoto amava qualquer tipo de pássaro desenhado em folhas infantis de desenhos, cadeiras de plástico, folhas secas, ele amava topo tipo de inexistência forjada sem compromisso d'alma. um dos seus pássaros era, entretanto, real, e daí eu preciso chorar goles de bebidas para não suprimir o texto, nem transbordar palavras de outros prantos. o pássaro-vivo.

 ***

 o pássaro-vivo era uma lagoa de dessobriedade - porém alçava voos comoventes que tocavam pr'além do corpo, tocavam fundo nos olhos, tocavam os espantos inerentes à vida. e não sabia disso, talvez se soubesse por delicadeza teria se retirado de cena ou aos poucos se eliminado. 
 eu não quero lembrar de como, conforme seus corpos se tocavam, meu menino e o pássaro iam se contradizendo até a síntese de seu existir. como o pássaro fugia restituído e ele caía perdido de essência, até não sobrar mais nada e eu, com as armas que não me cabiam, atirar no pássaro que voava isento de inocências. ele se diluiu em terra, e eu o perdi para sempre. desde então: resto.

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