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sexta-feira, 31 de julho de 2015

Shot II


 De conversa, pela noite, não havia barulho - a TV reinava, sussurrando publicidades. De manhã no elevador, permaneciam taciturnos. De madrugada, no entanto, se amavam baixinho.
 Se fizessem barulho, podiam acordar.

Shot X


 Ele percorria a casa de madrugada. Fazia vultos. Estava morto. Muito só, procurei-o; disse - tenho um fantasma em mim, pra te contar. Não apareceu. Acho que se assustou.

Shot IX


 Conversamos sobre legumes, política, dinheiro, restaurantes, dança, cinema, cães e sofás. Mas, no silêncio, o olhar se encontrou demorado. Disse demais . Desde então, não nos vimos.

Shot VIII


 Germano decidia um destino de viagem e riscava em seu mapa. Certeiro - jeito ou outro, ele ia. Um dia, por acidente, fez um risco no meio do mar. Demoraram dez dias para achar o corpo.

Shot VII


 "querido diário. hoje, enquanto fazíamos amor, encontrei uma pinta nova nele. nunca havia visto essa. é bonita. fiquei surpresa e brava. como, em cinquenta e quatro anos, nunca havia visto essa?"

Shot VI


 morava em frente ao minhocão. bancário. dois filhos (viviam longe). sua alegria era, aos domingos, colocar uma grande cabeça de monstro (um ator deixou pra trás numa mudança) na janela. os pedestres dominicais observavam a cabeça, curiosos. sua diversão era imaginar o que os pedestres imaginavam.

Shot V


 foram tirando a roupa. não se tocaram. falaram coisas proibidas. se olharam fundo até o gozo.
 depois, como já era tarde, desligaram suas webcams e foram dormir.

Shot IV


 bebeu todas - a única que queria estava perdida pra sempre.

Shot III


 Tocou o sexo. Botou a boca. Virou, abriu, deixou. Levou, doeu, gozou. No fim, virou pro beijo, sem sucesso. Era íntimo demais.

Shot I


 se conheciam há dois meses. afinidados - se doavam em tom igual. quando um resolveu tocar mais lento, o outro assustou - melhor parar. "estamos rápidos demais".

sábado, 28 de setembro de 2013

Naufrágio


onde está?
me encontre num momento qualquer
numa rua seja
qual for: repousando silenciosamente
no canto de um quarto, imaginando.

encontre-me
saindo ao mundo de peito aberto.

no navio naufragado, está tudo bem;
não leva mais o peso de tripulantes há muito mortos
repousando no fundo do mar, muito mais tranquilo que sua superfície revolta.

me encontre no barco naufragado.

está tudo bem, mas não da forma como você imagina.
está tudo bem como num barco naufrago
peixe solitário
silêncio navegar


sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Curta


 _ tó, mãe
 _ o que é isso, meu filho?
 _ é tempo mãe, você falô que tava sem

 mãe e filho se encaram. o filho estende o pote cheio de cascas de caramujos de jardim, as mãos sujas. sobra um silêncio, passa um minuto

 _ pega mãe, que o tempo tá passando
 _ tá filho ... pera ... mamãe tá meio ocupada, deixa no balcão que eu já pego
 _ mãe, o tempo já venceu, ó, cabou
 _ ...
 _ agora só tem caramujinho. deixa. eu pego mais depois, que agora eu tô sem tempo, vou falar com a Nina.
 _ ...
 _ tchau mãe.

sábado, 1 de junho de 2013

bolha nº 2 (opaca)


 ... eu queria contar essa história pra alguém. essa história que nunca começa, pois precisa ser contada. como um bordado não existe sem que o tecido seja, primeiro, violado, e a linha o trespasse. não quero divagar. a história nunca começa, sopro as bolhas pra que sejam eternas - mas tornam-se eternos os sopros, morrem as bolhas. as bolhas são mais bonitas, porém. também são as crias que não vingam. e os sonhos que morrem, as falas interrompidas.
 a certeza de que você vai morrer é uma lança que, me cortando, não dói. talvez porque você não signifique nada ainda, talvez amanhã. você é uma bolha que eu soprei - preciso encontrar o sopro. que permanece.

bolha nº 1


 se alguém olhasse bem perto da bolha e visse um universo? nesse universo vivem seres que se perguntam coisas de luzes, de narizes rarefeitos, corpos limpos. a bolha dura um tempo de vento soprar além do muro da casa para rua (espanto e felicidade do gerador da bolha) - nesse tempo único nós deuses estivemos na presença dos seres rarefeitos de narizes, da bolha nascidos, que meio tempo entre a brisa e o estouro tiveram a ousadia de se perguntarem - quem somos eles?

 ***

 antes de se esvair em sabão e gotas, no universo um poeta existia. tiveram a ousadia também de possuir poetas e escreviam coisas. nós deuses não pudemos (mas teríamos) classificado-as grama e filo e mentirosamente tal qual boi em pasto a palavra que emanou da bolha.


sexta-feira, 24 de maio de 2013

Notas


 "what will you look like when you're old?
  what will I do if I don't know you?
 I guess that I decided not to ask the day I took the road."

 pensei tão gravemente na sua pele se curvando sobre si, e nos cabelos finos caindo caindo caindo caindo caindo ... sons graves ... sei entretanto que você morre antes desse fim. compreendi tua natureza. você é como uma peça maior que o som de tão bela e triste, apesar da alegria aparente. eu, me afogando numa agonia muda, só tive a opção covarde/corajosa: partir no primeiro ato.

 ***

 estar rodeado de si e não se conhecer - será essa a prova de algo imaterial? o espírito que me habita e é - eu, ser material, tateando seus contornos buscando saber qual formato possuo e limito ... eu, limite duma coisa a qual pertenço e possuo sem, entretanto, comandar.  

 ***

 se você amar, simplesmente, no violento ato eterno de encarar sua própria face no espelho - ou, com os pés, esmagar uma flor. esse amor nascido de violência, surpreso - e se você amar? partir para fora de si e se abandonar - todos os caprichos, todo o eu, todo esmero - sujar-se como nunca antes - num passado, o antepassado divertindo-se quebrando pescoços de galinhas e vendo jorrar sangue. se você amar assim outro homem? sem a condição. as condições. afundar no sujo da incondicionalidade e rasgar prantos. se jogar no absurdo do ser/estar e viver, empapuçar-se de fluido úmido e do antes de você (matéria negra) ... se você amar? será perigoso? vamos, aos poucos, inundar seus olhos turvos, rapaz. e, da sua fantasia de menino, fazer longas tiras loiras ...

 ***

 ... e sermos jovens e percebermos - e nos apressarmos - e nos contermos - e termos medo - e não irmos pra praia numa quarta-feira - e só irmos dançar inofensivamente - bebermos sem perigo - voltarmos pra casa - e nunca partir - e sermos jovens velhos até morrer ...

domingo, 19 de maio de 2013

Suor


num farol da avenida tiradentes, A mulher vende água gelada _ eu achei curioso que do seu corpo escorresse o suor vivo _ talvez se ela pudesse colher o próprio suor para vender _ as pessoas, obviamente, não o beberiam _ porém se o guardassem _ juntando aquele suor ela própria nascesse _ ou ainda uma outra mulher, que vendesse água gelada no farol _ eu acharia tão curioso que do seu corpo nascido do suor escorresse mais suor vivo e ela, serena, sequer percebesse ou se desse conta de viver.

domingo, 28 de abril de 2013

Pra Você me Entender II


 ... mas e eu querendo me explicar; seria tão mais simples dizer que tenho uma alma de cachorro (se é que você entenderia) ... é uma confiança de tudo, apesar da falta de graça constante; uma vontade de viver pelos vazios; desfrutar de silêncios; e deitar ao sol todas as manhãs ...

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Uma carta (outra)


 _ o espelho não me vê mais. quando passou um pássaro pra consolidar a perdição me dei conta de crescer a casca, belo invólucro de homem adormecido mas ah, se você me procurar estou olhando da janela do trem os prédios velhos, tão maiores que eu, em busca de amores fáceis, facas e punhais, dilacerações entre casos de polícia. eu pequeno entre altos prédios marrons de mãos dadas com minha mãe. entre as ruas do susto e do deslumbre, me perdi, olho para o alto vendo passar cicatrizes e sombras, coisas assim menos efêmeras (as sombras dos homens são a mesma sombra) - não posso olhar pra trás nem pra frente - apenas para onde meu infinito começa - acima.

cof cof 

   sem me esquecer de que isso é uma carta sem lição alguma prum destinatário ignorado/ante, mande beijos pra mamãe e diga às mães do brasil todas - um beijo. mando na carta também as cinzas de outra carta que contém um poema de amor sobre cinzas ... de nada vale o amor senão para queimá-lo em cartas (dizem os mestres na arte).

ps.: na segunda estrofe, substitua a palavra constância por um pedaço de carvão.

terça-feira, 23 de abril de 2013

Uma carta


_ tudo bem com você? espero que sim. estou sobrevoando um rio e ao meu lado, uma nesga de nuvem cobre um rosto, estou cansando dessa vida tão excitante! meus porta retratos estão tão vazios e isso me torna tão feliz ...

 (não ... tudo está tão vago - venho soletrando palavras desconhecidas - tomei solidão no café da manhã entende? mas era hora de sair também, e ser homem, e ser mais, e escrever outra história comum entre histórias comuns na história comum. amanhã eu sou outro e você, estranho no espelho, a onda que vaga e bate na proa, lembrança cor melancolia)

 _ ... parabéns por apagar odes e odes e ódios. são coisas que passam batidas. eu mantenho meus porta retratos vazios, mantenha os seus, a morfina da ilusão corre veias e vias de regras. mas sem pensamento demais, sem filosofia, deixe isso pros teóricos ...

  (como ... se todas as caminhadas me levam a mim ... não me elevam a nada ... e a leveza me foge como um pena que dança quadrilha no céu. e se o motor da vida não fossem os porta retratos que precisam de rostos que encaram e movem, encaram e movem ... e se não há fotografia que nos prove nem em memória)

_ ... você será tão feliz assim, como eu também persisto, Deus luta fé destino objetivos caminho. ninguém precisa de poemas. só é preciso Deus luta fé destino caminho e nunca pensar, jamais pensar, em hipótese alguma. beijos, pasárgada. a ursa maior mandou lembranças, risos!

 (queimo outra resposta mas espero que cheguem em segurança as cinzas ... e que elas respondam o que as palavras não contêm - ps.: estou bem)

quarta-feira, 7 de março de 2012

A Pequena Ana III



Soube que, também antes de desaparecer, Ana decidiu morar numa caixa de fósforos com seu noivo, quando já grande no amor mas descobriu que ainda era pequena por fora. Todo domingo ele acendia um fósforo, a luz a ofuscava. Um dia porém sem fósforos ele a acendeu e ela o ofuscou, sorrindo, era verdade então que no amor não era só grande mas era luz, luz que não pode ser grande mas pode ser forte, que se espalha – Ana se espalhou por ele e fugiu da caixa num brilho no escuro, e se dissipou na noite. Mas ela ainda não havia sumido por completo.