sexta-feira, 3 de maio de 2013

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 existem dois momentos, um supostamente passado e outro supostamente presente (porém se ele está sendo narrado agora isto significa que ele já faz parte do mesmo passado que o primeiro. e os passados não tem fronteiras, podem se misturar deixados a mercê da memória ou da confusão ou da bebida ... ). a linha que os liga começa, logicamente, no primeiro, com uma frase complexa - será possível achar um caminho ou quem sabe um meio-termo, pois estou estou louco e é como amanhecer e estar perdido de si, caminhando insone. eu deposito etc etc. e, por ser um começo de frases, está entre sombras, outras palavras não ditas debaixo do texto precisam falar como testemunhas oculares dum crime político _ ele já sabia (testemunho nº 1) _ na corda fina que separava a realidade do desejo, sentiu dor (testemunho nº2) _ a essa altura, sentado numa praça, chorou convulsivamente, sem aparentemente saber por quê mas como se antevisse o futuro, sozinho (testemunho nº 7).
 um começo muito delicado para ser contido num primeiro momento. a linha prossegue seu caminho de existir mas preferimos ocultar uma narrativa, para isso existem romances e pilhas de contos e blogs pessoais. queremos o segundo momento. onde o futuro desabrocha e morre sem murchar. a frase que termina a ligação dessa linha tênue é mais simples, será? não queremos destrancar seu signo íntimo e espesso ou talvez ela não signifique nada. as vezes que percorro com os olhos meu corpo e vejo o vazio profundo em forma de buraco-negro de bala, fico calado e hesito, hesito entre existir e desistir, em ser gente e ser lobo. não há testemunhas para o crime que se cometeu agora. uma mulher no ponto de ônibus disse para ele  não namorar que dava trabalho e os moços deviam estudar, né? uma pessoa que passeava com um cachorro olhou firme em frente ... mas isso são migalhas, coisas sem importância e não tem valor jurídico ...
 deus, escrever é tão dificil que precisamos desistir de ser gente e ser outra coisa. 

*** 

 afinal, o que será isso? dois pontos distantes no tempo ligados por uma linha que mal existe num plano real e táctil ... onde as coisas se transformam pra sempre? esse não é o caso de um porta-retratos que te lembra alguma coisa. no limiar entre estar só ou em si, um garoto precisa crescer. ele é esses dois momentos tão profundamente como ele deseja ser um terceiro ponto no vácuo. esse é um caso de um inconformismo com o acaso. temos poucas provas, havia verdade e ela é inútil agora. ele sabia antes e depois veio a certeza, que é uma verdade confirmada em si, e depois um desespero e depois ainda, muito depois, no segundo ponto: essa tristeza diante de qualquer coisa infinita e irremediável. a priori por que era um garoto e todos os sentimentos nessa idade são ou levianos ou muito profundos e truncados, e ele por infelicidade de acaso era do segundo tipo de pessoa assustada e quieta - porém séria sempre, até seu riso era sério ainda que nunca parecesse, tudo estava sombreado. de verdades, também. ele deu muitos nomes as coisas como: vela, navio, amor ou tempo e eram verdades. mas contra a indiferença são mortos dom-quixotes ... e o acaso não poderia ter sido mais criança, se fosse consciência de qualquer coisa. será sobre isso? ou estamos apenas tristes? talvez seja mais simples como uma xícara quebrada é irreversível. o segundo momento se confunde com o primeiro mas com os olhos secos inundados de realidade apenas. uma frase nasce da boca, me perdoe a intolerância mas perdi seu nome e virtude num buraco-negro de bala ... que partiu a porcelana do meu peito ... em mil constelações.

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